Berço da saúde suplementar, o plano de saúde.

Os planos de saúde coletivos empresariais são uma conquista dos trabalhadores e um dos maiores benefícios concedidos pelos empregadores.

Grande parte oferece esse benefício como forma de reter talentos e melhorar a competitividade.

Com a entrada em vigor da Lei Federal 9.656/1998 (Lei dos Planos de Saúde — LPS) e logo após a criação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), por meio da Lei Federal 9.961/2000, o segmento da saúde suplementar começou a ter maior amadurecimento, algo necessário para o desenvolvimento do setor que tem relevante impacto na economia do país.

Embora ainda recente

Temos pouco mais de 20 anos de lei especial, diversos são os debates em torno do texto legal e das regulamentações editadas pela ANS.

Para essa opinião abordarei o Tema 1.034 do STJ que analisará pelo rito dos recursos repetitivos os recursos especiais 1.818.487, 1.816.482 e 1.829.862.

Para firmar tese no sentido de “definir quais condições assistenciais e de custeio de plano de saúde devem ser mantidas a beneficiários inativos”,

Nos termos do artigo 31 da Lei 9.656/1998.

Ao afetar o tema o STJ propôs a análise de dois fatores:

  • (a) custeio do plano por parte do ex-empregado e ,
  • (b) condições assistenciais de cobertura.

Nos votos para justificar a afetação, o ministro Antonio Carlos Ferreira destacou que “condições dizem respeito:

  • ao tempo de permanência no plano, se por prazo determinado ou indeterminado;
  • aos direitos assistenciais do ex-empregado e seus dependentes;
  • aos encargos financeiros que serão suportados pelo ex-empregado”.

Tempo de permanência no plano de saúde

De forma objetiva, o texto da lei é claro ao afirmar que somente terá direito a permanecer na condição de inativo por prazo indeterminado:

enquanto houver relação contratual entre o ex-empregador e a empresa operadora de saúde

Aquele empregado que contribuiu por prazo mínimo de dez anos para o seu plano de saúde.

Embora omissa quanto à possibilidade de contribuição contínua ou não, entendo que deve ser computado para esse prazo mínimo de dez anos todo o período de contribuição.

Não deve ser interrompida a contagem desse prazo mínimo em decorrência de eventuais suspensões de contribuição por parte do ex-empregado, iniciando novo prazo a partir da nova contribuição.

De outra sorte, se o ex-empregado contribuiu por prazo menor do que os dez anos, este poderá se beneficiar à razão pelo tempo que contribuiu.

Vale lembrar que a coparticipação, franquia, valores pagos por dependentes ou agregados não são considerados como contribuição,

Conforme artigo 30 parágrafo 6º da Lei Planos de Saúde, o artigo 2º da Resolução Normativa 279 da ANS e tese firmada pelo STJ no Tema 989.

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Condições assistenciais de cobertura

Diante das últimas decisões do STJ[1] voltadas para a saúde suplementar, é possível afirmar que o tribunal referenciará mais uma vez a Resolução Normativa 279/2011 da ANS.

Tal norma regulamentou os artigos 30 e 31 da LPS e revogou as Resoluções do CONSU 20 e 21.

Isso trouxe conceitos minuciosos sobre os direitos dos beneficiários demitidos sem justa causa ou aposentados que contribuíram para o plano de saúde fornecido pelo ex-empregador.

Definiu o órgão regulador que a manutenção do ex-empregado que tem o direito concedido pelos artigos 30 ou 31 da LPS:

nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho

Quer dizer que ele terá a mesma segmentação e cobertura, rede assistencial, padrão de acomodação, internação, geografia e abrangência.

a) Mesma segmentação e cobertura

Previstas no artigo 12, incisos I a IV, da LPS, é direito do ex-empregado que contribuiu para o plano quando ativo ser mantido com a mesma segmentação enquanto vigente o seu contrato de trabalho.

Embora omissa a regulação sobre a possibilidade de upgrade ou downgrade no tipo de segmentação, entendo como possível caso seja opção do consumidor que foi desligado da empresa contratante e desde que previsto no contrato firmado pelo seu ex-empregador.

Já em relação à cobertura contratada, entendo ser mais simples, sem margem para discussão, pois acompanhará as limitações trazidas pelo rol da ANS e o contrato, como reforçado pelo STJ no julgamento do REsp 1.733.013.

b) Rede assistencial e padrão de acomodação

Interpretando o texto da lei:

  • A rede assistencial do plano de saúde do ex-empregado deve ser a mesma que o beneficiou durante o seu vínculo trabalhista com a empresa contratante, podendo, no entanto, sofrer alterações desde que as mesmas sejam realizadas também para o plano dos empregados da contratante.

Hospitais, clínicas, laboratórios e profissionais que faziam parte do plano quando o consumidor era empregado da empresa contratante devem, ser mantidos no novo plano.

O mesmo entendimento deve ser aplicado quanto ao padrão de acomodação no caso de internação — enfermaria ou quarto particular.

Qualquer diferenciação nesse contexto pode ir de encontro ao conceito de “mesma condição de cobertura”, o que não será admitido pelo STJ.

c) Área geográfica de cobertura e fator de moderação

A área geográfica é aquela onde o plano de saúde garante as coberturas contratadas pela empresa empregadora, podendo ser classificada da seguinte forma: municipal; grupo de municípios; estadual; grupo de estados; nacional.

Isso quer dizer que nesta área contratada pelo empregador a operadora de plano de saúde tem rede assistencial credenciada para garantir todos os atendimentos necessários. Aos empregados e ex-empregados.

Nos termos e nos prazos previstos na Resolução Normativa 259/2011 da ANS.

Caso a operadora, por algum motivo, não tenha disponível determinado prestador na rede credenciada dentro da limitação geográfica contratada — no município, por exemplo — ou dentro do limite máximo de tempo previsto naquela resolução, deve ela disponibilizar a cobertura por prestador não pertencente à rede no mesmo município ou limítrofe.

Caso a operadora não conseguir essa disponibilização excepcional, deverá ela garantir o transporte do beneficiário até um prestador apto para realizar o atendimento fora.

d) Fator de moderação

Os fatores de moderação dos planos dividem-se em coparticipação (valor pago à operadora de plano de saúde) e franquia (valor pago ao prestador).

São eles uma excelente forma de mitigar a utilização desenfreada e desnecessária por parte dos beneficiários, visando manter adequado o equilíbrio econômico-financeiro do contrato coletivo empresarial e a própria sustentabilidade do contrato e do segmento.

Com previsão na Lei 9.656/98, grande parte das empresas contratantes de planos de saúde utilizam esse mecanismo com a intenção de baratear a contratação.

Com isso para educar os seus colaboradores para que façam o uso racional e sustentável do benefício concedido.

O novo produto do ex-empregado deve seguir o raciocínio do item anterior. Se existia a coparticipação ou a franquia durante o vínculo de emprego deve ela seguir no novo plano quando do seu desligamento.

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Custeio do plano

Recentemente o STJ firmou posicionamento sobre a necessidade de contribuição por parte do empregado através do rito dos recursos repetitivos.

O Tema 989, cuja tese é:

Nos planos de saúde coletivos custeados exclusivamente pelo empregador não há direito de permanência do ex-empregado aposentado ou demitido sem justa causa como beneficiário, salvo disposição contrária expressa prevista em contrato ou em acordo/convenção coletiva de trabalho, não caracterizando contribuição o pagamento apenas de coparticipação, tampouco se enquadrando como salário indireto.

Para a presente análise, o “encargo financeiro” destacado pelo ministro relator para o tema diz respeito ao valor que será assumido pelo ex-empregado para a manutenção do seu plano — que abrange também eventual fator de moderação.

Embora não identifique dúvida no texto da parte final dos artigos 30 e 31 da LPS (“desde que assuma o seu pagamento integral”), há debate em diversos processos judiciais envolvendo a interpretação da expressão pagamento integral.

Para determinada corrente, pagamento integral significa apenas aquele valor já assumido pelo empregado quando da manutenção do vínculo de trabalho com o ex-empregador. Essa é a minoritária, da qual não faço parte.

Outra, que tem mais força e deve ser seguida na análise por parte do STJ, entende que esse valor é aquele contratado.

Ou seja, se o produto X na faixa etária Y custa R$ 100 para a empresa contratante e o seu empregado contribuiu com R$ 30, quando do seu desligamento, deverá ele assumir o pagamento do valor contratado (R$ 100).

Essa deve ser a correta interpretação do texto legal.

Mesmo assumindo o valor integral da contratação, certamente o ex-empregado pagará preço menor do que o comercializado pela operadora de plano de saúde no segmento individual/familiar para o mesmo produto.

Tendo em vista a maior precisão do cálculo atuarial da massa de beneficiários daquele contrato e a possibilidade de adequação de eventual desequilíbrio financeiro no reajuste anual.

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Considerações finais

Por fim, é de se destacar que a ministra Nancy Andrighi votou contra a afetação do tema e trouxe importantes reflexões, principalmente quanto à ausência de uniformidade de entendimentos por parte do próprio STJ.

Sublinhou a ministra que importantes conceitos para a solução jurídica do assunto foram deixados de fora da tese firmada para a afetação, como, por exemplo, a possibilidade de planos distintos para empregados e ex-empregados.

Comungo em parte com as ponderações aprestadas naquele voto.

No meu sentir, a matéria é relevante e está madura para apreciação através do rito dos recursos repetitivos, devendo, no entanto, a delimitação da controvérsia ser mais abrangente e específica.

Deveria constar da ementa da controvérsia, por exemplo:

  • Obrigatoriedade ou não de plano uno para empregados e ex-empregados;
  • Se há direito adquirido à forma de custeio;
  • O conceito de admissão do beneficiário em novo emprego que possa encerrar o benefício garantido por lei;
  • Apreciação, também, das regras do artigo 30 da LPS.

Não me surpreenderá caso ocorra algo semelhante ao debate envolvendo a legalidade do reajuste por faixa etária acima de 59 anos de idade nos contratos individuais/familiares.

A tese firmada no Tema 952 não pôs fim às controvérsias sobre o assunto.

O STJ foi obrigado afetar novos recursos para apreciar o mesmo assunto de forma mais lapidada, agora, nos contratos coletivos (Tema 1.016).

É importante que todos os envolvidos nessa discussão promovam esclarecimentos e subsidiem os magistrados com argumentos e técnicas que possam aclarar a especificidade desse setor, com o viés único de perseguir a sustentabilidade em prol de toda a saciedade e do país.

(Fonte: https://www.conjur.com.br/2020-fev-04/stj-definir-regras-inativo-permanecer-plano-saude2 )